Quando era miúda tinha problemas em partilhar. Não, não tinha qualquer problema em partilhar lápis, canetas, borrachas ou bonecas. Tinha problemas em partilhar o que me ia na alma…
Não contava a ninguém as coisas que me eram verdadeiramente queridas. O que me fazia sorrir. O que me fazia chorar.
Havia várias razões para essa reserva. Duas são, no entanto, as principais: achava as minhas ideias ridículas e não gostava de “importunar” as pessoas com elas.
Fui crescendo e as vitórias foram-se tornando solitárias.
Nunca me furtei a viver, mas partilhar conquistas quando ninguém sabia o valor que lhes atribuía era ridículo.
Isso foi mudando. A idade traz sabedoria e, suponho, relações de amizade mais sólidas...
Agora partilho o que me vai na alma. As pessoas têm acesso ao que me é querido. Eu falo. Conto. Rio. Choro.
As conquistas, no entanto, continuam a ser solitárias. Não sei porquê. Muitas das “minhas coisas” continuam a ser muito minhas… (Suponho que todos somos assim…) No entanto, já consigo partilhar o sentimento de vitória e consigo que as pessoas o percebem…
Tenho o orgulho de dizer que o faço que algumas pessoas maravilhosas. E que gosto muito de as ouvir relatar as suas conquistas.
Talvez por isso me choque um pouco quando alguém aparenta ter-me ouvido, quando alguém me deu palmadinhas nas costas, pediu pormenores, me deu os parabéns, riu comigo e depois… descubro que não ouviu uma palavra do que eu disse… quando eu falava de algo basilar na minha existência… Existência essa que devia ser importante. Afinal, nunca é à toa que usamos a palavra amizade anos a fio!
É duro. Faz-me pensar que o ser humano é, na sua génese, egoísta. Importa o “eu”. O resto é informação supérflua. Não importa o quanto partilhámos antes. Talvez nem o tenhamos verdadeiramente partilhado… Talvez tenhamos aparentado uma partilha. Talvez andemos todos a iludir-nos e as nossas vitórias sejam, sempre e em qualquer circunstância, solitárias…
…Suponho que este texto deve ser também um “mea culpa”...
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5 comentários:
A amizade é uma jóia muito rara e só lhe damos o verdadeiro valor quando a sentimos... nos momentos de verdade!
muito do nosso "eu" não temos coragem de partilhar... esperamos que os amigos o sintam...
Beijos e bom domingo
≈♥Ňąd¡®♥≈:
Há muito tempo que eu deixei de esperar que alguém adivinhe o que me vai na alma... Isso para mim nunca passou de ilusão. As pessoas não têm esse dom. E, se o tivessem, acho que a maior parte nem se dava ao trabalho...
(Isto sem desfazer na maior parte das minhas queridas amigas, que eu adoro e que, embora não adivinhem nada, muitas vezes estão atentas... e isso basta.)
"Havia várias razões para essa reserva. Duas são, no entanto, as principais: achava as minhas ideias ridículas e não gostava de “importunar” as pessoas com elas."
conheço essas razões.
quanto ao que dizes no final:
acho que sei a que te referes.
mas nem é isso que importa.
infelizmente, temos sempre de contar apenas connosco.
porque, se umas vezes vamos ter alguém para nos ouvir...
noutras, podemos ñ ter...
talvez seja isso, egoísmo.
É preciso partilhar, mas ser escutados é muito exigente e muito raro. Partilhar com quem nos não escuta, é esbanjar intimidade.
Joaquim Santos
www.joshuaquim7.blogspot.com
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