quinta-feira, outubro 30, 2008

O meu pai - The sequel

Uma vez que o texto anterior causou tanta consternação, eu vou lançar mais “achas para a fogueira”. Não tanto porque me chocam as soluções simples e conselhos básicos que me deram (perdoem a agressividade! As minhas reacções a quente tendem a ser agressivas… Deve ser influência do meu pai…), mas mais porque EU preciso de lidar com isto de vez. E, assumir o problema sem pudor, é sempre uma boa maneira de o fazer.
Eu não suporto o meu pai. E, sobre isto, disseram-me: “tenta”, “se queres fazer algo sobre o assunto, é agora que tens de o fazer”, “eu não conseguia viver assim” e até houve uma amiga que me perguntou se isto era mesmo verdade...
Pois bem, são 30 anos de tentativas falhadas. O que é que é suposto eu fazer? Humilhar-me? Suplicar? Auto flagelar-me? Digam-me por favor, se é que conhecem soluções mágicas. Porque francamente, ao ponto a que as coisas chegaram, a minha luta é por não lhe dar importância o suficiente para que continue a conseguir magoar-me. Esta é a MINHA solução. E já sei que, desta forma, se houver uma próxima vida (porque nesta já não se resolve nada, trust me!), vou “levar com ele” outra vez. Eu sei disso!
Quanto a “não conseguir viver assim” é bonito. Mas digam-me, o que fariam então? Sairiam de casa? Com que dinheiro? Lembrem-se que o papá não vai ajudar! Deixavam a vossa mãe de 74 anos à mercê da estupidez do marido? Ou obrigavam-na agora a sair também? Vá! Digam lá, por favor.
Quanto a perguntarem-me se é verdade… Sim, é verdade. É verdade desde que me lembro. Desde que me lembro o meu pai confunde o conceito de respeito com o de medo. Só que agora EU já não os confundo.
Diz-me, Ka, tu que duvidaste, porque é que achas que eu não procuro ninguém quando preciso de ajuda? Eu tenho uma teoria... Quando era miúda e procurava os meus pais com um problema próprio da idade tinha duas respostas possíveis: 1. Uma ameaça. 2. “Shhh! Não digas isso que o teu pai pode ouvir!”. É isto que eu sempre tive. E, portanto, habituei-me a resolver tudo sozinha.
Um exemplo? Tinha 11 anos no dia em que pela primeira vez confessei à minha mãe que sentia algo mais do que amizade por um colega. Tive a infelicidade de o meu pai ouvir. Antes de a minha mãe me responder, o meu pai disse-me que eu tivesse juízo, porque se eu me transformasse numa puta, punha-me na rua e eu teria de trabalhar para viver em vez de viver no bem bom às custas dele e andar a estudar. Vou repetir: eu tinha 11 anos. Nem sequer conhecia muito bem o conceito de sexo…
Mas não me interpretem mal. O meu pai é um bom homem. Um homem trabalhador e honesto e moral. Muito moral. Com uma moralidade à prova de bala. Tão à prova de bala que confunde sentimentos com depravações. E não sabe amar. Amar, para ele, é manter sob controlo. Quem não lhe obedece, não o ama. E, por isso, uma ou outra ameaça física ou uma ou outra surra ao longo da vida não foi culpa dele. Foi nossa.
Ora, uma criança não sabe que nas outras casas é diferente. Mas uma adolescente começa a perceber que sim. E uma mulher adulta não tem dúvidas.
Portanto, por favor – e mais uma vez, PERDOEM-ME a agressividade – não me dêem lições se não passaram pelo mesmo, OK? Não tenham ideias românticas de que com uma conversa séria tudo se resolve, se nunca se ajoelharam em frente ao V. pai a pedir, por amor de Deus, uma consulta de terapia familiar e receberam um empurrão trocista e uma ameaça em troca, OK? Não me digam o que fazer, se nunca viram a vossa mãe levar um estalo à vossa frente, OK?
Ah! Desculpem. Isto também foi culpa minha. Quando eu era miúda, o meu pai mandava-me sempre sair da sala quando ia… hum… chatear-se (?) com na minha mãe. Eu é que, dessa vez, por acaso, voltei para lhe pedir desculpa por qualquer coisa que tenha feito. Afinal, a culpa de ele estar tão zangado era seguramente minha. Logo, eu é que tinha colocado a minha mãe em maus lençóis, como sempre. Eu tentei pedir desculpa para o evitar… Parece que não cheguei a tempo…
Na verdade, não sei quantas vezes não pedi desculpa nem quantas vezes eles me mandou sair da sala. Demorei um bocado a perceber o que se passava quando eu saía da sala. Esse é um dos meus fantasmas… Quantas vezes? Era frequente? Não era? Eu podia tê-lo evitado…?
Sei que, agora, não saio da sala nem ele me manda sair. Mas dou graças a Deus por sair todas as manhãs de casa. Porque estive desempregada um ano e meio e perdi a conta às vezes em que acordava com o meu pai a insultar a minha mãe. Mas não interpretem mal, por favor! Não são cenas desagradáveis. Não. Ele CONVERSA com a minha mãe. Muito. Ele conversa dando-lhe ordens e dizendo que ela é estúpida e inútil e gorda e etc. Nada de gritos. Até porque a minha mãe não responde. Não há motivos para gritar. E também não há motivos para eu interferir. Ele não me manda sair da sala, mas eu não sei o que se passa quando saio de casa. Por isso, não vale a pena enervá-lo mais. Bastava mostrar que estava acordada e a ouvir e ele calava-se. Até à vez seguinte. Talvez amanhã. Talvez apenas quando eu não estivesse a ouvir.
Mas digam-me, devemos sair de casa (Para onde? Para alguma instituição de acolhimento? E depois vou trabalhar para o meu emprego altamente qualificado, de gente a quem isto não acontece, no dia seguinte, certo?) e deixar um velho de 73 anos totalmente dependente a viver sozinho, inundado de merda e fome? Sim, porque ele é COMPLETAMENTE dependente da minha mãe. Não por necessidade, mas por criancice. Não conseguiria estrelar um ovo, mesmo que a vida dependesse disso. Não lavaria uma camisa, não pegaria numa vassoura. Nem tão pouco sabe que comprimidos toma e para quê! Deixariam AGORA um velho inútil, que já não tem força para concretizar as ameaças que faz, sozinho, à sua mercê? Agora?
Por favor… Não me dêem, por isso, lições. Não me façam sentir que não fiz o que podia fazer e até mais do que isso. Não me digam que algo pode mudar porque é essa merda dessa crença que me apanha desprevenida de vez em quando e me faz continuar a chorar, agora não de tristeza ou culpa, como tanta vezes em miúda, mas de raiva pura por deixar que ele ainda tenha a capacidade de me magoar. Como no dia em que deu entrada no hospital e estava um cordeirinho totalmente dependente da opinião da mulher e da filha que tanto ama…
Esse é outro fantasma. O meu pai é um senhor muito simpático para a maior parte das pessoas. As minhas amigas acham-no um porreiraço. É difícil explicar que as moedas também têm duas faces. Até eu tenho dificuldade em ver isso às vezes. E é isso que eu não me perdoo. Não sou burra. Mas às vezes pareço. Porque, como vocês, às vezes também quero acreditar…

segunda-feira, outubro 27, 2008

O meu pai

Eu não suporto o meu pai. Não tenho paciência para ele. Nunca vou ter.
Quando era mais nova, culpava-o pela minha infelicidade. Agora que cresci… faço o mesmo! Tudo o que de mau eu herdei veio dele. Tudo o que ele me ensinou deu errado. Tudo o que me quer ainda ensinar, eu rejeito.
Detesto a forma como me ama. Odeio o que quer para mim. Não suporto os valores e princípios que tem. Não o suporto a ele.
O meu pai pôs um pacemaker a semana passada. Levá-lo ao hospital desenterrou tudo o que eu tinha conseguido esconder debaixo do tapete para conforto dos dois. Apesar de vivermos na mesma casa, ignorávamo-nos mutuamente com grande sucesso até aquele dia. Ele a fingir que se preocupa comigo, e eu a fingir que isso me enternece.
Naquele dia descobri que não consigo segurar-lhe na mão. Não tenho jeito para o confortar. Não suporto estar ao pé dele, quer esteja doente ou saudável. TUDO o que faz ou que lhe acontece irrita-me mais do que me preocupa. Não o consigo evitar. E muito menos fingir.
Também já não sinto culpa pela situação ser como é. Não a sinto porque me recuso a senti-la sozinha e com ele não posso contar para a partilhar, já que, na cabeça daquela criança de 73 anos, eu é que sou a má da fita.
Não há diálogo. Não há razoabilidade. E estou cansada de birras. Sempre as fez mais do que eu, mesmo quando eu era criança.
No dia em que regressou a casa quis-me bater, o velho! Nem para se preservar consegue estar quieto. Coitado. Não percebe que se me toca, agora, leva troco, com ou sem pacemaker. Não acreditou quando lho disse. Ainda bem que só distribuiu murros pela mobília…
…E ainda pensa que tem família. Família? Família é ter pessoas que nos amam. O que ele tem é uma ilusão. E só.

quarta-feira, outubro 15, 2008

Diferenças de género*

_Estou preocupado. – Disse o namorado. Estavam sentados na sala da casa dele, local de esporádicos serões em conjunto. – Não sei dos meus CDs favoritos. Tinha-os num arquivo que costumava trazer no carro. E agora desapareceram... Acho que mos roubaram.
_Não estão na tua mala de viagem? Levaste-os para o Algarve, lembraste? – Respondeu ela prontamente sem dar demasiada atenção ao assunto. Na verdade, a hipótese era bastante remota. Já tinham passado dois meses desde as férias no Algarve...
Mas ele levanta-se de rompante e desaparece para o quarto sob o olhar admirado da rapariga.
_ESTÃO AQUI! – Grita eufórico do quarto! – Volta à sala e beija-a com ternura. Ela tinha-o salvo…

_ Bebé, preciso de um casaco de Inverno. Podias vir comigo dar umas voltinhas às lojas. Sabes que eu valorizo a tua opinião… Além disso, és o meu melhor amigo… - Ela tentava convencê-lo com aquele ar de garota traquina e olhar terno.
_Ohhhh. – Responde ele esparramado na cadeira. – Estou TÃO cansado hoje…
Ela não insiste. Não vale a pena…
Olha para ele enquanto passa nos lábios o baton de cieiro que comprou há dois ou três dias. Não é o da marca habitual, porque esse estava esgotado, mas, apesar de não ter visto o efeito ao espelho, ela acredita que este lhe dá o mesmo brilho – apenas brilho – aos lábios que o outro, um brilho simples que lhe é característico, uma vez que não costuma usar maquilhagem. No olhar tem um misto de mágoa e condescendência.
_Ohhh, não me odeies. – Diz ele adivinhando-lhe os pensamentos.
Não havia nada a fazer. A conversa ficou por ali. Sem mágoas.
Foi já em casa dela, sozinha, que finalmente se olhou ao espelho… O baton que ela acreditava dar-lhe apenas brilho aos lábios, deixava-lhe, na verdade, um rasto vermelhão vivo na boca, que lhe realçava todas as imperfeições da cara de pele branca. E, como não costuma usar maquilhagem, nunca teve a preocupação de delinear os lábios com cuidado, pelo que, a “pintura” era tosta e desmazelada. Andava nesta figura desde que comprou o baton e o enfiou, descontraída, na carteira HÁ DOIS OU TRÊS DIAS!
_Não acredito! – Disse para a palhaça que olhava para ela do espelho. – Não posso crer que NINGUÉM tenha achado estranho! Meu Deus! Não acredito que ELE não me tenha dito nada!...

Moral da história: As mulheres salvam SEMPRE o dia aos seus homens. Os homens mal olham para as suas mulheres.

* Post partilhado com o blog Cardos & Prosas.

quinta-feira, outubro 09, 2008

Longo Inverno...

Não encaixo. Não vale a pena procurar o lado zen da vida. Ele, para mim, não existe.
Eu bem tento olhar para tudo com distanciamento, já “dando o desconto”, mas a verdade é que não tenho hipóteses nenhumas!
Não encaixo.
Ora é porque não suporto as “diferenças” entra quem chega a chefe e quem não está talhado para isso (que é o meu caso, claríssimamente!), ora é porque não suporto as superficialidades do mundo que me rodeia, ora é porque estou farta de me sentir desvalorizada, até quando tenho a certeza do que estou a fazer.

Três episódios simples…

Chove a potes. Dois guarda-chuvas descansam junto à porta de entrada da empresa. Termina uma reunião com o Presidente do Conselho de Administração. Ele chega à porta, pega indiscriminadamente num dos guarda-chuvas e pergunta:
_De quem é isto?
Uma das colaboradoras acusou-se...
Resposta do chefe:
_Bom, agora é meu. Quer dizer… Eu depois devolvo-lho… Ou antes… Na verdade, as probabilidades de lho devolver são muito escassas. …Bom, vou levá-lo.
E foi-se.
Isto é para rir? Ou para chorar?

Numa visita a uma amiga que fez uma redução de estômago, uma outra amiga esteve, como sempre, a dar-lhe dicas de dieta. É habitual. Quando alguém fica privado de comer, fala-se em comida; quando alguém fica privado de tomar banho, fala-se de higiene, etc. Mas durante toda aquela visita se falou de dicas de emagrecimento. Deram-se lições…
À noite, num jantar colectivo de gajas, a perita em dietas encheu o prato de sobremesas que eram em buffet…
Isto é para rir? Ou para chorar?
Ou devo catalogar aquilo no file “futilidades”?! …Como aquelas em que se comenta a gordura da Jennifer Lopez que está ÓPTIMA apesar de APENAS há oito meses ter tido DOIS filhos GÉMEOS! Ou como as alusões às rugas do Pierce Brosnan que eu nunca cheguei a ver, apesar de ter tido o privilégio de “conhecer” o senhor…
Talvez eu seja cega…
Eu prefiro acreditar que, em vez de ser cega, a dose normal de futilidade presente no ser humano não me foi distribuída por altura da criação!...
Mas mesmo sem a dose “regular”, queixo-me do meu rabo e dos meus dentes e recebo aplausos quando digo que quero mudar algo em mim…
Isto é para rir? Ou para chorar?

Sou RP. É o meu trabalho. E ex-jornalista. Embora por vezes duvide das minhas capacidades, sei EXACTAMENTE como funciona isto dos media e o que “vende” na Comunicação Social. Sei qual deve ser o comportamento perante quase todas as situações em que seja necessário um contacto directo com a imprensa. Em suma: é o meu trabalho. E eu SOU competente (FODA-SE!!! EU SOU competente!).
Mas o meu chefe não percebe que quando eu lhe dou um conselho que ele não segue, está a “habilitar-se”… Não percebe que, quando eu lhe digo “É assim!”, não lhe estou a dar uma opinião oca, estou a dar-lhe um conselho ESTRATÉGICO pelo o qual supostamente ele me paga um salário!
…Depois os media publicam merdas onde criticam o MEU trabalho!
Mas isso não incomoda o meu chefe, que não percebe que não é só o nome dele que está em jogo. Não percebe que o MEU nome, por pequeno que seja, também está em jogo nesta cidade que é, na verdade, uma aldeia onde ninguém se esquece dos erros dos outros.
Para o meu chefe, as críticas ao meu trabalho são fait divers. Ao passo que, quando está ele na boca do lobo, fala em processos judiciais.
Mas como todos os miseráveis deste país… Eu PRECISO do salário…
Isto é para rir? Ou para chorar?

Estou cansada.
O zen parece-me cada vez mais inalcançável.
E, batam-me, porque estou a “ser gaja” demais!
O que vale é que a maturidade nos dá para encolher os ombros em vez de chorar…
Mesmo assim… vai ser um loooooooongo Inverno….

quinta-feira, outubro 02, 2008

O stress da estrada

Já conduzo. Ainda sou maçarica, mas conduzo. Regularmente. Por aí. E não há dia NENHUM em que eu não insulte alguém. Não aos berros de fora da janela. Não, isso não!, porque não se sabe o que anda por aí dentro dos carros. Insulto, porque tem de sair! Insulto… em conversa com o meu "vermelhinho"...
_Olha-me para este f**** da p***! Olha-me bem para o gajo parado com meio carro em cima de passeio e meio carro no meio da estrada depois de uma curva, hem…?! Lindo! Quem te partisse esses dentes aos pontapés levava um beijo meu, pá!
E sigo viagem. Serena. Até à próxima rua em que já sei que vou encontrar idiotas...
_ Ora, vamos lá ver hoje quem é o caramelo que decide ultrapassar-me, a mim, que vou a 50 km/h, numa rua cujo limite é… 50 Km/h! …Ora, cá está…. Lá vai ele… Quem te amassa-se essa cara toda era o meu herói, oh boi!!! Agora cá estamos nós, meu energúmeno, meu cabrão!, todos juntinhos no sinal vermelho. O que é que ganhaste com a proeza, hem?, meu estúpido?!
À hora de almoço, normalmente lá vai mais um desabafo:
_Olha, lá vem mais uma tia de BM a buzinar atrás de mim! Oh, minha p***, não vês que o limite é setenta?! Se o teu carro voa, passa por cima, oh idiota!
Olhando para mim, ninguém diria que da minha boca podem sair tanta água de esgoto. Ninguém… quer dizer… Só se forem os transeuntes que me ouvem enquanto passo de janela aberta… Às vezes, esqueço-me que ela vai aberta…