O perímetro de Earl’s Court, para Sul, varia entre o deprimente e degradado e a típica paisagem de capa de disco dos Beatles. Até tirámos uma ou outra foto a atravessar a rua com as casinhas todas iguais em pano de fundo. Naquele caso particular eram casarões. Mas, até Chelsea, o nosso destino, também passámos por apartamentos de bom gosto montados em caves que nenhum português ocuparia por não conseguir ver a luz do sol.
Chegámos a Fullham Road já cansados, mas mais cinco minutos e o estádio do Chelsea surgiu do nosso lado direito.
Tudo é azul em Stamford Bridge. Azul e com cheiro a dinheiro. A primeira coisa que vimos foi o enorme hotel do clube. Mas depois há também o imponente bar “Blues”, a mega-store de merchandising e o moderníssimo “The Chealsea Club” health club.
A forrar uma das enormes paredes que ladeiam o estádio está uma foto, a perder de vista, com centenas de adeptos vestidos de azul. No meio da massa humana surge a equipa com Mourinho ao lado (assim era quando lá fomos…). Aquela foto é imponente, envolvente, arrebatadora. Faz-nos sentir mais um adepto, desejoso de vestir azul e gritar pelo clube nas cadeiras (azuis) do estádio.
Não pisámos a relva, mas fomos gastar dinheiro à mega-store, o que é basicamente a mesma coisa. É que quando saímos, de saco preto - muito fashion, tipo mochila - na mão, já sentíamos que conhecíamos os cantos à casa e tratávamos todos os elementos da equipa por tu! Resistimos à tentação de mandar gravar o nosso nome numa camiseta do clube. Isso, ali, é exequível em cinco minutos.
Saí de Stamford Bridge adepta do Chelsea e com a sensação de que, no nosso burgo, as coisas são feitas a brincar. Ainda temos TANTO para aprender em matéria de organização, sedução e conquista do público!!! Não vi NINGUÉM no estádio do Chelsea, mas, ainda assim, sinto que sei tudo o que queria saber. Fui completamente conquistada pelos Blues. (O que é que eu faço com este sentimento agora?!! LOL)
Regressámos à zona 1 do Metro num red bus de dois andares, pois claro. O almoço deu-se no “nosso bairro”, Earl’s Court. À mesa discutimos futebol… e bairros londrinos.
De alguma forma, Chelsea tinha-me desiludido. Não era nada do que eu esperava… Talvez tenhamos passado pelos sítios errados. Talvez Stamford Bridge seja longe do que deve ser visto pelos turistas em busca das ruas exultadas em canções que falam da meia-noite naquele bairro típico. O que eu vi nada tinha de típico. Jurei ir ao Google, quando regressasse a casa, para descobrir qual é, afinal, o cerne do bairro. Darei mais uma oportunidade a Chelsea. Também eu me quero apaixonar pelo seu luar...
A tarde foi bem distinta. Ninguém está preparado para ver a Pedra de Roseta ou as estátuas do Parthenon ao alcance de uma mão... Foi isso que encontrámos (sem surpresa) no British Museum.
Inspirador de muitas histórias de ficção, o enorme museu faz juz ao seu mito. É extraordinário em tudo. A arquitectura é esmagadora, de tão bela e clássica e de tão ampla e moderna. Dá para os dois tipos de gostos. É um edifício (para não destoar dos outros grandes edifícios de Londres) colossal. Mas colossal em tudo! Dentro das vitrinas tem guardadas quase todas as relíquias da humanidade.
Não vimos nem metade. Escolhemos a dedo que nos interessava e, mesmo assim, tiveram de nos pedir que abandonássemos o local porque “o museu já está fechado”…
Este é o tipo de coisa a que só damos valor depois. Impacientei-me dentro do British Museum. Estava cansada demais e fechada dentro de um edifício há demasiado tempo! No entanto, olhando para trás, nem acredito que AQUELA era A Pedra de Roseta! Que AQUELAS eram as estátuas do Parthenon!!! Enfim…
Eram 6h da tarde. Cedo demais para dar o dia por terminado.
St. Paul foi o destino óbvio. Já tínhamos escutado os sinos, vislumbrado a cúpula, mas a visita tinha de ser oficial! Tínhamos de dar a volta à catedral, sentir a sua estatura, fotografá-la de todos os ângulos. Assim fizemos. Não pudemos entrar. Fecha cedo… Mas, à sombra da sua monumentalidade, deslumbrámo-nos e… descansamos os pés.
Com as forças retemperadas, fomos até à Vestry House, símbolo da destruição de Londres durante a II Guerra Mundial e, depois, voltámos a contornar a fenomenal catedral de St. Paul para atravessar a Millenium Bridge.
O meu namorado estava estafado, mas Southwark era logo do outro lado da ponte! Ele nem se apercebeu que foi habilmente manipulado para que eu pudesse voltar ao bairro em que me sinto no ninho…
A Millenium Bridge não abana tanto quanto os ingleses dizem. Essa, se dúvidas existissem, teria sido uma das constatações. Outra foi que a luz de um pôr-do-sol londrino, no fim de um dia quente e luminoso, é única e arrebatadora. Nunca tirei fotos tão plásticas, tão “salientes”, tão bonitas… Cheguei ao “meu”bairro ao pôr-do-sol… E, novamente, o sentimento de serena e eufórica pertença caiu sobre mim.
Southwark invade-me, enche-me, preenche-me.
Debaixo do puro tom dourado deixado pelo sol que se despedia do Thames, lânguido e preguiçoso, percorri, mais uma vez, as deslumbrantes ruas empedradas, atravessei os túneis escuros e estreitos, com cheiro a humidade e a história, as praças douradas e cheias de vida. O MEU bairro continuava a acarinhar-me...
A Tate Modern, o Shakespeare Globe Theatre, o Winchester Palace, o Prison Museum, o Golden Hinde (réplica do galeão de Sir Francis Drake que, no século XVI, atracava naquela mesma doca) e, finalmente, a extraordinária Catedral de Southwark...
Não sou religiosa, mas aquela igreja fascina-me. Não parece nada um local de culto. Ao olhá-la temos a sensação de estar perante um forte, mas depois, a delicadeza e o pormenor das suas fachadas, cobertas de pequeníssimas pedras de um tom mágico entre o castanho e o violeta, leva a nossa mente a sugerir-nos que estamos perante um palacete senhorial. Mas é uma igreja. Ainda que aparentemente sem vocação, é um local de culto. E isso enternece-me. Não sei porquê.
Fiquei alguns minutos a olhá-la, a fotografá-la. Mas o meu gajo já estava farto de me aturar e nem sequer sabia deste meu absoluto entusiasmo. Para o levar até ali, tinha-lhe prometido que apanharíamos o metro em London Bridge, “a estação mais próxima”. Desisti, por ele, de ver a Hay’s Galleria (antiga doca transformada em shopping muito fashion) e de continuar o meu idílio até à Tower Bridge.
Chegámos a London Bridge quando o sol se despedia finalmente. Ignorámos a London Dundgeon e entrámos no impressionante forte de metal que era a estação.
Mais um simples jantar em Earl’s Court marcou o fim de outro dia muito cansativo.