domingo, maio 28, 2006

Quando eu fui groupie

Dar “um concerto” no banco de trás do carro de dois desconhecidos, em pleno Pinhal de Leiria. Apanhar uma boleia do dono da Big Cancil para a estação de camionetas de Santa Maria da Feira, enquanto ele nos dava um sermão sobre “os perigos da noite”. Fingir que era uma jornalista furiosa, com um editor imaginário do outro lado da linha telefónica, só para conseguir um quarto “naquele” hotel, que, por acaso estava lotado de ciclistas da Volta a Portugal. Apanhar um comboio onde, além de um infindável número de soldados, só iam mais duas pessoas: nós, produzidas… Fazer uma inversão de marcha por cima de um duplo contínuo porque um telefonema nos chamou de volta…
As histórias sucedem-se. São tantas que algumas já as esqueci.
São de quando eu era groupie de algumas bandas famosas…
Não sei se groupie é o termo certo. Afinal, nunca dormi com ninguém na estrada e, ao contrário da maior parte dos fãs, passei muitas noites – Vá, algumas noites… Não, bastantes noites! – a ouvir as mágoas dos artistas, das bandas ou dos staffs…
Suponho que posso dizer que vi subir. E vi cair. E eu subi e cai com eles. E sem eles…
São muitas histórias e muitas pessoas que amo ainda profundamente. Por quem eram, por quem foram e por quem são. Por me terem feito a mais feliz das criaturas e a mais miserável. Sofri muito. Aprendi muito. Cresci tanto!
Não me arrependo de nada. Faria tudo outra vez. Acho que, a esta distância, já posso dizer, sem medo de errar, que foi o período mais incrível da minha vida.
Corri o país de ponta a ponta. Conheço praças, fontes, igrejas, cafés, hotéis e discotecas. E gente, muita gente!
Estive em festas populares e em festas privadas. Jantei em mesas corridas de madeira com bancos de pau e ao lado das maiores estrelas do momento.
Sorri e chorei. Por mim e por outros. Recebi carinhos e pontapés.
Foi fantástico!
Não recomendo o que fiz a ninguém…
Andar à boleia. Passar noites ao relento. Ser olhada como prostituta pelas criadas dos hotéis… Não. É insano! Mas é intenso…
É verdade que nessa altura VIVI. Sim, com maiúsculas. Vi de tudo e em todo o lado.
Ainda me lembro do dia em que o meu pai desistiu de mim…
Eram oito da manhã e eu estava a chegar a casa de mochila às costas, vinda de Leiria. Um telefonema e um banho depois, saí, novamente de mochila às costas. Os meus pais, estupefactos, sentados à mesa do pequeno-almoço, só tiveram tempo de me ouvir dizer: “Vou para Santa Maria da Feira. Volto amanhã.”…Nunca mais me perguntaram mais nada… A não ser a minha mãe: novidades sobre um elemento da banda…
E aquela outra vez, na Mealhada, em que a banda nos viu chegar? Saíram dos quartos e invadiram o carro novo da minha colega… Ela andou uns tempos sem conseguir pôr o banco no sítio…
Ou ainda aquela outra vez em que, saídas da Flashen, em Quiaios, no meio do mato, às 6 da manhã, não tínhamos como chegar à estação da Figueira da Foz, para voltar a Coimbra? Não há crise: o motorista leva o grupo ao hotel e depois vem buscar-nos e leva-nos à estação… Pois… mas no concerto seguinte o mesmo motorista decidiu vir trazer-me a casa… Simpático, não? O problema é que me fez a corte à porta de casa, com o Sol a raiar e os vizinhos a acordarem, durante horas…
São muitas, muitas as histórias…
O beijo à minha amiga em frente ao hotel… Ao que ela respondeu: “Então boa noite.”… A boleia ao membro descontente que culminou numa retirada estratégica do hotel, porque a banda “tinha de conversar”… A guerra de batatas fritas com o restaurante inteiro a olhar para uma das estrelas do momento… O “balecito”, dançado em grupo, na Scotch, numa noite que terminou com a minha colega sentada no chão da casa de banho a chorar…
As noites tão curtas. Os sound checks quase privados. Os abraços. Os sorrisos. As lágrimas. Muitas lágrimas. E muitos sorrisos. Mas nem um autógrafo!
O que guardo? …Além da maturidade conquistada a pulso? Recordações. Muitas. Alguns amigos. Alguns inimigos. Muitos conhecidos. E o desejo de que todas aquelas grandes e pequenas estrelas sejam muito felizes e que, longe ou perto das luzes da ribalta, consigam, finalmente, viver em paz consigo próprias e com os outros…

6 comentários:

Anónimo disse...

Bem GK, já vi que vou passar a visitar mais um blog... o teu! Vou ter de ler aos poucos, mas posso dizer-te que a tua escrita me prende. Obrigado pelas palavras que me deixaste. Bom fim de Semana. Bjs de Luz

Pisces Girl disse...

Ando mesmo a precisar de ter na minha vida aventuras como estas...

Bjs!

SoNosCredita disse...

"Fingir que era uma jornalista furiosa, com um editor imaginário do outro lado da linha telefónica, só para conseguir um quarto “naquele” hotel(...)"

esta gostava de ter visto! ;)


"Estive em festas populares e em festas privadas."

e ñ é tão bom?! :)))


"Além da maturidade conquistada a pulso?"

já é mto!

GK disse...

SoNosCredita,
Sim´FOI MUITO BOM! E obrigada pela companhia em algumas destas viagens! (E, quando digo viagens, não me refiro só a deslocações de um sítios para outros...)

;)

Bj.

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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