quarta-feira, julho 08, 2009

Amizades circunstanciais e outras lições de vida

Andei 30 anos enganada. Achava que a vida me estava a tentar ensinar a ser altruísta, generosa, solidária. Mas não. Todo o esforço que fiz para ser menos egoísta, para prescindir do meu tempo, das minhas paixões, das minhas coisas em prol de algo ou alguém, foram genuína e totalmente perdidos. Afinal, o que a vida quer que eu aprenda é a impor limites à minha generosidade.
No good deed goes unpunished, diz um ditado na língua de Shakespeare e é verdade. Sempre que mudei de rumo por alguém, sempre que sacrifiquei os meus planos em prol de outro, sempre que dei mais, fiz mais, sofri mais… levei com o mundo na tromba. Sangrei de tristeza. De falta de retorno. De castigo maior. Até ver que nada vale a pena.
_ Equilíbrio! - Diz-me uma sábia amiga, - a vida quer ensinar-te equilíbrio entre o que dás e que precisas que te dêem.
Equilíbrio, diz ela. Com razão, talvez. Mas no meio-termo não há paixão. Não há emoção. Não há lágrimas nem gargalhadas. Há sorrisos educados. Portas que se fecham e se esquecem. E o que eu preciso é que me levem o coração e me façam arrancar a pele. E que o façam por mim também. Que me emocionem. Me amem. Me escolham.
E aqui reside mais uma fonte de frustrações. A minha vida está demasiado formatada. Educada. Já não é a adolescente que eu odiava e amava, mas que eu sabia que tinha sangue na guelra. Tornou-se cinzenta e previsível.
Pisam-me os calos? Está bem. Exigem o que não posso dar. Vou ver isso. São injustos. Eu espero que passe. Blá. Blá. Blá. Sem sangue, nem arrepios. Sem paixão, nem conquistas. Cinzento. Tudo.
E eu odeio quem me deixa viver assim. Odeio os meus amigos. Todos. Que me deixam aqui. Todos! Menos aqueles que, pelas circunstâncias, não me chegaram a conhecer os pensamentos na totalidade. Os novos. E os velhos que estão distantes. Perdoo esses. Os outros não. Os outros abandonaram-me. Foram embora. Viraram as costas.
Sou agressiva, por isso ninguém fica para me aparar as lágrimas quando sofro, com medo de serem arranhados pelas minhas garras vis. E vivi com isso. Sou fechada, por isso ninguém consegue arrancar-me o que me vai na alma e muito menos adivinhá-lo. E eu perdoei isso. Dou e dou e dou e vazia de dar sem receber, imponho limites. E o pior acontece. Perco-os. A todos.
Good riddance.
Não os quero por perto. Nenhum. Chega de cobranças e acusações, chega de usos e abusos e de epítetos e títulos. Quero ser OUTRA pessoa e não me deixam. Quero ter outros adjectivos e não mos dão. Quero que me amem e me leiam e me cuidem e não o fazem. Quero-os, por isso, fora de mim de vez.
Mas, sem forças para grandes paixões, desabituada de as ter, ou, se calhar, consciente de que tanto faz, continuo a ser a amiga de circunstância. A que responde às dúvidas e às questões sobre como se faz isto e aquilo. A que vai ao concerto ao Domingo á noite e que aceita as conversas de café. A que resume em duas frases o carrossel da vida quando alguém o pede. E eles gostam disso. Isso basta-lhes. E odeio-os por isso também.
Com as existências finalmente formatadas em casais mais ou menos convencionais, ter Amigos (com A grande) dá, suponho, demasiado trabalho. Não a mim. Que roubei horas da minha relação para pegar em mãos alheias. Mas a todos os outros custa, parece-me, fazer o mesmo. E então sou aquela a quem ninguém pergunta “Como estás?”. Aquela a quem as ausências não são questionadas com o “Porquê?” a que todos têm direito. Aquela por quem nunca ninguém saiu nem vai sair do seu rumo. Aquela que sempre esteve lá, mas já não está de tão vazia. E isso é imperdoável!
Desconhecida. Até de mim própria. Não sei quem é este ser de sangue frio que me habita. Que não vira a mesa. Já não sei encontrar saídas e soluções. Perdi-me algures. Choro. Seco as lágrimas. E durmo uma noite à espera que passe. Não passa. Estou sozinha. Sempre sozinha. Agora, assumidamente sozinha. E altiva nisso. Afinal foi assim que sempre estive. Apenas não o sabia.

7 comentários:

Anónimo disse...

Algumas das palavras... tiraste-mas do coração e da cabeça...São exactamente o que sinto!

Apenas um reparo... sabes dar-te (para os outros), mas não te sabes dar... (de ti. E isso habitua (mal?) as pessoas...

SML

Nilson Barcelli disse...

Não sei o que te diga depois de ler este impressionante desabafo.
Querida amiga, espero que encontres o caminho à tua medida. Vai procurando que ele existe.
Bom fim de semana.
Beijo.

mixtu disse...

pois...
uma visão
um estado
h+a dias assim, e depois come-se uns camarões ou ameijoas e tudo passa... claro está à beira-mar...

o estar sozinha... ora cá está uma boa candiadata para pastora na minha serra, só tens que ter mãos frias para fezeres um bom queijo

abrazo serrano

Carracinha Linda! disse...

Olá GK...

É com alguma tristeza que leio estas tuas palavras, este teu desabafo. A vida é uma escola onde se aprendem várias lições. Mostras ser uma pessoa que está presente quando é preciso. mas também sei, por experiência própria, que isso faz com que os outros te tomem por garantida. Não perguntam o tal "como estás" quase até se esquecem que também existes. Mas mal mostram sinais de precisarem de ti, lá estás tu para o que for necessário. estava eu a dizer que a vida nos traz várias lições. E provavelmente uma das mais complicadas, tal como disse a tua amiga, é achar o ponto de equilibrio entre o que dás de ti e o que podes dar e o que precisas de receber. Acho que não há uma forma fácil de aprender esta lição... eu própria sou muito como tu, sempre pronta para o que precisarem. E sempre triste por não ver o mesmo nos outros. No meu caso, estou a tentar não me dar tanto, só mesmo às poucas pessoas que eu sei que também se preocupam comigo. Isto não é uma solução perfeita, mas foi a forma que eu arranjei para me proteger. Não sei se isto te ajudou ou não... Mas não fiques assim triste. até porque não és tu que estás errada: são os outros que não têm a mesma atenção contigo que tens com eles.

Beijinhos

Kalua disse...

Para não variar parece ser algo que eu poderia ter escrito na sua essência, mas nunca o conseguiria pôr da mesma forma...
bjs

mitro disse...

Como estás?

SoNosCredita disse...

"Com as existências finalmente formatadas em casais mais ou menos convencionais, ter Amigos (com A grande) dá, suponho, demasiado trabalho."

nunca fui convencional e acho q isso se vê ao longo do tempo, pq continuo sem fazer parte desse 'grupo'...

bem, qnt à solidão, a minha tb ning ma tira.

e tb ñ sei espernear, neste momento, por causa disso!